29 de abril de 2012

Atividades IED I

Bibliografia:
DWORKING, Ronald. A virtude Soberana. São Paulo: Martins Fontes, 2006.  => Capítulos 9 e 11

Extrair do texto:
(Textos trabalhados na aula de sexta - 27/04/2012)
# Os elementos do conceito de direito.
# Como o autor justifica (explica que são justas) as cotas?
# O que são ações afirmativas?
# O raciocínio do autor se aplica ao Brasil? Justifique.


Prova oral =>
04/05/2012 (Textos: O Positivismo Jurídico (Norberto Bobbio) e O Modelo Jusnaturalista (Norbeto Bobbio e Miquelângelo Bobbio)) => 1,0
# Em que momento histórico (período temporal) ocorre o Jusnaturalismo e o Juspositivismo? Qual o contexto filosófico e científico dessas escolas?
# Quais os principais pensadores do Jusnaturalismo e do Juspositivismo? Qual é o argumento utilizado pelo autor para justificar a reunião dos jusnaturalisata em uma única escola?
# Qual a diferença entre a conceituação do Positivismo como escola e como teoria?





O POSITIVISMO JURÍDICO 
1-Positivismo Jurídico versus Positivismo (Filosófico)
        Em  sua obra  O Positivismo Jurídico, a primeira questão levantada por  Norberto  Bobbio foi a distinção  terminológica entre positivismo jurídico  e positivismo (filosófico), demonstrando, então, a sua preocupação com a análise da linguagem, proveniente da filosofia analítica, a qual era prosélito.
        Neste aspecto, o autor, não obstante uma certa ligação entre os termos, posto que no século XIX alguns positivistas jurídicos também o eram em sentido filosófico, conclui que o termo positivismo não deriva do positivismo filosófico, e sim, da locução direito positivo. Para corroborar tal assertiva, Norberto Bobbio argumenta que o positivismo jurídico “surge” na Alemanha e o positivismo (filosófico) na França.
Partindo do pressuposto de que o termo positivismo jurídico deriva do direito positivo, Norberto Bobbio analisa a evolução histórica deste direito, no pensamento clássico, medieval e moderno, normalmente em posição antagônica ao direito natural.
2- O Direito Positivo no Pensamento Clássico
a) Na Grécia No mundo grego, o nomikón dikaon, ou seja, o direito positivo ou direito legal próprio de cada comunidade política distinguia-se do physikón, o direito natural, que vigorava em toda parte do mundo grego. Considera-se o direito natural como comum e o positivo como especial, ou particular de uma civitas.
Norberto Bobbio proclama a prevalência do positivo sobre o natural no caso de conflito de leis, baseado no princípio lex specialis derogat generali, citando como exemplo o caso da tragédia Antígona de Sófocles. Deste exemplo, embora se trate de um tema polêmico entre os vários doutrinadores, Norberto Bobbio generaliza para toda Antigüidade Clássica a prevalência do direito positivo sobre o natural, inclusive entre os romanos.
b) Em Roma Para os romanos a dicotomia existia entre o jus civile, limitado aos cidadãos romanos e o jus gentium, comum a todos os povos assimilados pelo Império Romano.
Na fase do Império Bizantino, já na Idade Média, com o Corpus juris civilis, no governo do Imperador Justiniano, a compilação do complexo de normas romanas impôs uma clara prevalência do direito positivo sobre o natural, onde sobressaía a monopolização jurídica por parte do Estado.
3- O Direito Positivo na Idade Média

        Na Europa, durante a Idade Média, existiam inúmeros sistemas jurídicos bem diferenciados. Isto ocorreu, não só pela imigração forçada (dos germanos e dos eslavos) e pela invasão (dos árabes) em determinados pontos do território europeu, particularmente, nas áreas do antigo Império Romano do Ocidente, como também, pelo aspecto pluralista da sociedade feudal, onde cada segmento possuía o seu próprio direito.
            Deste imenso mosaico sobressaíram o direito canônico, que desempenhou um importante papel por toda Idade Média (decaindo com o Renascimento e com a Reforma) e o Direito Romano. Este sobreviveu na Europa Ocidental do século VI até o século VIII, renascendo através da Escola Jurídica de Bolonha, a partir do primeiro milênio e se irradiando por vários territórios, sobretudo na Alemanha.
           O direito romano iria se difundir com o nome de jus commune, correspondente ao direito natural, isto é, o konói nómoi (aristotélico) ou o jus gentium (romano), que era o direito comum a todos os povos. Contrapondo-se a este, existiu o jus proprium, direito das diversas instituições sociais.
Com a autonomia das comunidades e dos reinos, concedendo-lhes, inclusive, capacidade legiferante, o jus proprium prevaleceu sobre o jus commune.
Para filósofos e teólogos da Idade Média, a lei natural era revelada de conformidade com a lei Divina e a lei positiva estabelecida de acordo com a lei natural, tornando-se óbvio, portanto, que, no cenário medieval, a prevalente seria a natural, fundada na própria vontade de Deus.
4- O Direito Positivo na Era Moderna
            Na Era Moderna, o Estado passou a concentrar todos os poderes e como conseqüência tornou-se o único criador do direito, fosse através da lei ou reconhecendo ou controlando as normas de formação consuetudinária.
Nesta fase, abandonar-se-ia a concepção do direito inspirado na ordem teológica, como fez a Escolástica, para fundamentá-lo com argumentos humanos e terrenos, baseado na racionalidade, surgindo, então, o naturalismo racionalista.
         A partir daí,  encontrava-se à disposição  da  sociedade  um  ordenamento com normas gerais coerentes, promulgadas pelo poder soberano, de modo semelhante à ordem do universo, fundada em leis naturais, universais e imutáveis. Assim, todas as transformações sociais eram provenientes da lei, considerada uma atividade dinâmica, consciente e racional, em detrimento do costume, visto para os racionalistas, como uma fonte inconsciente, passiva, logo, incapaz de promover modificações importantes.
         Baseado em Hugo Grotius, Norberto Bobbio distingue o direito natural do direito positivo pelas denominações jus naturale e jus voluntarium. O jus naturale fundava-se em certos princípios da reta razão, segundo os quais uma ação seria considerada moralmente conveniente ou não à própria natureza racional e sociável do homem. O jus voluntarium possuía três fontes do direito: o direito familiar ou paterno, o Estado e a comunidade internacional, isto é, o jus gentium, entendido como jus inter gentes.
Ainda desta época, era Frederico Glück, citado também por Norberto Bobbio, que distinguia o direito natural do positivismo pela forma pela qual os destinatários tomavam conhecimento das normas. Assim, o direito natural conhecia-se por meio da razão tanto pela própria natureza, como por aquelas coisas que a natureza humana requer como condição e meios de consecução dos próprios objetivos; já o direito positivo se reconhecia unicamente pela vontade declarada do legislador.
            Para Norberto Bobbio só haveria o positivismo jurídico quando apenas o direito positivo existisse, pois a doutrina juspositivista não admite outro direito que não aquele imposto pelo Estado, através de sua capacidade legiferante, concretizada, mais adinate, pelas codificações.
Portanto, pelo exposto, conclui-se que a distinção entre o direito positivo e o direito natural existiu de maneira insofismável desde a Antigüidade Clássica e que o termo positivismo jurídico não deriva do positivismo filosófico e sim da locução direito positivo, de acordo com Norberto Bobbio.
5- O Positivismo Jurídico no Mundo Contemporâneo
          Norberto Bobbio usa o termo para caracterizar a origem do positivismo jurídico, com a qual não se concorda, uma vez que o positivismo jurídico foi conseqüência de um processo de evolução histórico-jurídico, existente desde a Antigüidade Clássica. Com a dicotomia entre direito positivo e direito natural, como o próprio Bobbio comprova, teve o desenvolvimento final não só na Alemanha, como na França e na Inglaterra.
         Os acontecimentos naqueles três países, verificados praticamente na mesma época, diferenciaram-se pelas peculiaridades históricas, próprias de cada um.
Mesmo se considerando que a concepção da Escola Histórica Alemã seja um positivismo jurídico em lato sensu, as suas características específicas, como a prevalência do costume e a ausência de codificação (causa imediata do positivismo jurídico, segundo Norberto Bobbio), se afastaram do positivismo jurídico clássico.
          A  concepção da referida   escola constitui uma reação ao marco  mais concreto  desta fase do positivismo jurídico - o Código de Napoleão. As idéias da Escola Alemã tornaram-se muito importantes para a difusão da teoria, posto que se constituíram na principal e na mais profunda crítica à filosofia naturalista, contribuindo assim para a “dessacralização” das concepções denominadas “mitos” jusnaturalistas.
          Sobre as codificações, se reconhece o valor trazido pela obra do Imperador Justiniano, porém somente com a legislação napoleônica é que se obteve um corpo de normas sistematicamente organizadas e expressamente elaboradas. Cabe destacar que mesmo o Código de Napoleão (1804), marco importante neste processo histórico-jurídico, inicialmente foi elaborado por um movimento francamente iluminista.
Mercê de fatores históricos peculiares a cada país, a implantação dos códigos nos mesmos repercutiu de forma totalmente diferente. Na Alemanha, não houve uma doutrina sobre a codificação, nem a codificação.      
           Na França, houve a codificação, sem, no entanto, existir uma doutrina sobre a codificação. Na Inglaterra, a despeito das teorias da onipotência do legislador e da mais ampla teoria da codificação, não houve a codificação.
a) O Positivismo Jurídico na França
A codificação, mesmo que sob a influência iluminista-racionalista, ocorreria na França e, mercê do espírito cosmopolita francês, repercutiria e produziria uma profunda influência no desenvolvimento do pensamento jurídico contemporâneo.
O jusnaturalismo racionalista da burguesia, com o êxito da Revolução Francesa, encontrou a possibilidade de realização de seus ideais através da lei. Alcançados os objetivos revolucionários, estabelecida uma nova ordem com a burguesia no poder, a lei de instrumento de construção social transformou-se em instrumento de sua conservação e naquele momento, o jusnaturalismo racionalista transmudou-se em direito positivo.
O Código de Napoleão tornou-se um reflexo desta acomodação, na qual os ideais revolucionários transformaram-se em conservadores.
Destarte, não era intenção dos redatores, ao elaborá-lo, fundar uma nova tradição jurídica; o acontecido deveu-se aos intérpretes responsáveis pela adoção do princípio da onipotência do legislador.
Mesmo na fase de elaboração, o Conselho de Estado, além de vetar o artigo 1º do projeto, considerando o último resíduo do jusnaturalismo, vetou também o artigo 9º por razões semelhantes. O artigo 4º, que para os redatores constituía uma possibilidade de livre criação do direito por parte do juiz, para os intérpretes em seu labor tornou-se um exemplo dos dogmas da onipotência do legislador e da completitude do ordenamento jurídico.
b) A Escola da Exegese
Com base nas idéias dos primeiros intérpretes, fundou-se a Escola da
Exegese, sustentando que a principal fonte de direito eram as leis, normas gerais escritas emanadas pelo Estado.
c) O Positivismo Jurídico na Alemanha
Inegavelmente, a Escola Histórica Alemã do Direito e o historicismo em geral foram muito importantes para a difusão do positivismo jurídico, no sentido de que representaram uma crítica radical e profunda ao direito natural.
           No Congresso de Viena e na Santa Aliança, os contra-revolucionários combateram a Revolução Francesa inclusive no plano jurídico. Ao racionalismo universalista revolucionário, os contra-revolucionários contrapunham os princípios irracionais do historicismo e os princípios nacionalistas. Ao direito natural, a Escola Histórica Alemã do Direito opunha o direito consuetudinário e o volksgeist. Não houve a codificação, embora as obras de Anton Friedrich Justus Thibault propugnassem pelo ordenamento do direito positivo alemão, especialmente o provado, posto que o direito, sendo de várias origens, germânica, canônica e romana, era de difícil interpretação. A codificação, além das vantagens decorrentes para os juízes, para os operadores do direito e para os cidadãos em geral, acarretaria um impulso decisivo no sentido da unificação alemã. As obras de Anton Friedrich Justus Thibault concorreram para sistematizar os primórdios da Escola Pandectista.
         Para Friedrich Karl von Savigny, a Alemanha, além de passar por um período de decadência, principalmente no que diz respeito à ciência jurídica, não estava madura para realizar a codificação. O único caminho para reverter tal decadência jurídica, segundo aquele autor, seria o trabalho dos juristas, buscando vigorosamente o renascimento e o desenvolvimento científico.
d) O Positivismo Jurídico na Inglaterra
Como aconteceu no continente europeu durante a Idade Média, também a
Inglaterra apresentava a distinção entre o jus commune e o jus proprium.
O primeiro correspondia à commom law, direito comum ou consuetudinário e o segundo, à statute law, direito estatutário ou legislativo. Diferente do que se observava no continente, em relação à precedência entre os poderes, na Inglaterra a common law limitava não apenas o Parlamento, como o próprio rei. A limitação política do poder real transformou-se numa causa de insatisfação para os autores que propugnavam pelo Estado tipo hobbesiano, no qual haveria a monopolização estatal do direito.
           Thomas Hobbes, ainda no século XVII, pode ser considerado como um precursor do positivismo jurídico.
Partindo de um estado anárquico, denominado de natureza, onde cada um lutava contra os outros, Thomas Hobbes concebeu o Estado, denominado de civil, onde todos atribuiriam o poder (a força) a uma só instituição, o soberano.
            Ao que tudo indica, Thomas Hobbes não descreveu um estado natural hipotético ou com base na pré-história, mas o existente na Inglaterra, durante as lutas religiosas, no século XVII.
Para o autor, as leis naturais tornar-se-íam obrigatórias para integrar as lacunas do direito positivo. O conceito de norma fundamental hobbesiano não era um hipótese normativa, como muito mais tarde aconteceria na concepção kelseniana, mas uma lei natural.
Ao afirmar que a lei era criada pela autoridade e não pela sabedoria, destacava o formalismo e o imperativismo que são considerados os princípios típicos da concepção positivista de direito.
Jeremy Bentham e John Austin elaboraram uma doutrina codificante utilizada em vários países, menos na Inglaterra.
           Para Jeremy Bentham, a sua codificação projetada deveria ser utilizada por todo mundo civilizado. As críticas do autor à common law tornaram-se importantes, posto que aclararam os motivos que impeliam o movimento iluminista a polemizar contra o sistema então vigente, buscando uma codificação condizente com os princípios do racionalismo.
         A concepção de Jeremy Bentham, de cunho universal, baseada no princípio de utilidade, além de lançar um sólido alicerce jurídico para grande reforma do direito no início do século XIX, desenvolveu, também, um espírito científico voltado para os problemas da criminologia e dos direitos penal e civil.
A obra de John Austin, além de representar o traço de união entre as várias correntes caudatárias do positivismo jurídico, especialmente entre o utilitarismo inglês e a Escola Histórica Alemã de Direito, lançou as bases da Escola Analítica de Jurisprudência, correspondente à Escola da Exegese na França. O normativismo austiniano iria impressionar não somente a Hans Kelsen, mas também influenciar o próprio Norberto Bobbio, que o considera o fundador do positivismo jurídico.
e) O Positivismo Jurídico no Séc. X
Na Alemanha, a ausência de uma unidade político-territorial, isto é, a criação tardia do Estado Alemão e a influência da Escola Histórica de Direito iriam concorrer para o atraso da codificação civil. Porém, mesmo os adeptos da Escola Alemã, com o correr do tempo, assumiram uma atitude dogmática normativista, em termos de leis consagradas pelo costume.
A matriz da Escola Pandectista era voltada para o positivismo, porém, neste contexto histórico, esta concepção só atingiria um nível sofisticado com Hans Kelsen.
Na primeira metade do século X, a ciência jurídica é dada como uma cidadela cercada por todos os lados de psicólogos, economistas e sociólogos; neste ambiente, é que se manifesta o movimento de “purificação” do direito, liderado por Hans Kelsen, através de sua doutrina, denominada Teoria Pura do Direito.
A implantação de doutrinas políticas radicais em vários países e a própria 2º
Guerra Mundial, em decorrência desta implantação, concorreram para inibir o verdadeiro espírito científico e, em vários casos, para a emigração de cientistas das mais diferentes áreas do conhecimento de seus países de origem.
           Isto iria proporcionar, mais tarde, após a guerra, não só maior identidade entre os componentes da comunidade científica, como também marcaria a trajetória das respectivas obras, com uma fase antes e outra após a deflagração mundial. Hans Kelsen é um exemplo típico deste status quo. Apresenta uma fase européia e outra em Bekerley, na Califórnia, onde a sua teoria atingiu pleno desenvolvimento. Nesta 2ª fase, comparou a teoria pura com a jurisprudência analítica de John Austin.
          Entre as principais características do positivismo kelseniano, podemos apontar: o direito pertence à esfera do “dever ser”, isto é, da normatividade, e sua estrutura é a do juízo hipotético, mantendo um caráter prescritivo; como juízo hipotético contém sempre a coação, disciplinando o uso da força; a purificação da ciência jurídica kelseniana significa torná-la livre de elementos estranhos ao método específico, ou seja, livre de elementos naturalísticos e valorativos; a norma fundamental kelseniana, referindo-se principalmente à validade das normas jurídicas, veio conferir características especiais ao positivismo jurídico, a partir de então; a teoria geral do direito kelseniano divide-se em normostática, referente à norma jurídica, e normodinâmica, referente ao ordenamento jurídico; a teoria do ordenamento jurídico caracteriza-se pela unidade, pela coerência e pela completitude.
           Numa primeira fase do desenvolvimento da teoria geral do direito bobbiano, Norberto Bobbio começa a construir uma teoria jurídica positivista, deslocando a racionalidade abstrata, patrocinada pelo kantismo na obra kelseniana, para uma racionalidade passível de demonstração empírico-lingüística.
Esta fase corresponde à fundação da Escola Analítica Italiana de Filosofia Jurídica, baseada na conferência Scienza del diritto e analisi del linguaggio.
           Numa segunda fase, a partir do seminário de Bellagio (setembro de 1960) houve uma adesão à teoria do positivismo jurídico, que embora não tenha constituído mudanças relevantes em relação à teoria geral do direito, levou à revisão de pontos importantes da teoria kelseniana.
Como causa destas modificações é apontada a entrada das teorias de Hebert L. A. Hart e Alf Ross no cenário cultural italiano. A Escola Analítica, nesta fase, com trabalhos de vários próceres, atingiu o seu auge, delineando-se com uma verdadeira escola jurídica.
            O núcleo da teoria geral de direito bobbiano foi constituído nesta fase com os cursos sobre a norma jurídica (1957-1958), sobre o ordenamento jurídico (1959-1960), além da obra considerada comentário histórico e síntese jurídica destas anteriores. Il positivismo giuridico (1961). Nesta obra, Norberto Bobbio explicita os três aspectos do positivismo jurídico, segundo a sua ótica, ou seja: o positivismo como método para o estudo do direito, como teoria do direito e como ideologia sobre o direito.
Numa terceira fase, uma crise sobre o positivismo jurídico, materializada na mesa redonda em Pávia (1966), abalou a Escola Analítica, acarretando uma importante dicotomia, pela via Bobbio, preocupada com o conceito de direito, de norma, de ordenamento jurídico e pela via Scarpelli, voltada para estudos de técnica lógico-analítica, com fins políticos.
             Concomitantemente a esta crise, outra (final dos anos 60) de conotação política iria, também, trazer conseqüências para todo o Mundo Ocidental, posto que o sistema político-econômico do pós-guerra apresentou sintomas de esgotamento. Embora em outras oportunidades já tivesse tratado da teoria funcional, foi no congresso celebrado em Milão-Gardone (1967) que Norberto Bobbio apresentou o texto Essere e dover essere nella scienza giuridica, onde demonstra uma mudança importante na concepção bobbiana da ciência jurídica, mercê da implantação do Estado Social.
        Desta maneira, de um entendimento do direito como forma de controle social e de bem-estar, Norberto Bobbio passou a considerar o direito, também, como um instrumento de construção social. Claro está que o novo posicionamento bobbiano implicava não só num maior distanciamento do kelsenianismo, mas buscava também um caráter ideológico para o positivismo, além de uma terceira via teórica (estrutural-funcionalismo), em face dos problemas sociais.
           Portanto,  conclui-se que Norberto  Bobbio não  foi  exclusivamente  um  mero   seguidor das concepções kelsenianas, muito ao contrário, de uma posição inicial, buscando aplicar a metodologia da filosofia analítica às teses kelsenianas, pouco a pouco se afastou das mesmas, até o desligamento total, posicionando-se em situação contrária ao espírito da teoria pura do direito, tornando-se, então, um inovador da teoria geral do direito.
          Norberto Bobbio não apenas deixou de se aprofundar no aspecto funcionalista do positivismo jurídico, como voltou-se, exclusivamente, para o tema da filosofia política.
A Escola Analítica de Direito Italiana (1972) recebeu um duro golpe, representado pela perda de seu principal elemento aglutinador, Norberto Bobbio, que deixa a cátedra da filosofia do direito para assumir a de filosofia política.


JUSNATURALISMO

Norberto Bobbio define o jusnaturalismo como a corrente do Direito que tem a convicção de que “uma lei para ser lei, deve ser conforme a justiça” e completa dizendo que “a teoria do direito natural é aquela que considera poder estabelecer o que é justo de modo universalmente válido” (BOBBIO, 2007, pag. 35).
Já Ronald Dworkin, em Império do Direito, afirma que as teorias jusnaturalistas “sustentam que os juristas seguem critérios que não são inteiramente factuais, mas, pelo menos até certo ponto, morais, para decidirem que proposições jurídicas são verdadeiras” e, segundo o próprio Dworkin, as correntes mais radicais do Jusnaturalismo afirmam que Direito e Justiça são coisas idênticas (DWORKIN, 2003, p. 44). 
Norberto Bobbio – em O Positivismo Jurídico – pautando-se em um critério histórico-social, divide a doutrina jusnaturalista em três fases: Jusnaturalismo Clássico, Jusnaturalismo Medieval e Jusnaturalismo Moderno (BOBBIO, 1999).
O Jusnaturalismo Clássico é aquele que se desenvolve através das idéias dos filósofos gregos, como Platão e Aristóteles que buscam uma justiça universal baseada em uma razão natural – naturalis ratio – e que posteriormente é adotado pelas escolas do ius gentium em Roma. Bobbio afirma que para Aristóteles, “o direito natural é aquele que tem em toda parte (pantachoû) a mesma eficácia” e que prescreve ações “cuja bondade é objetiva”, ou seja, trata-se de um direito justo e universal (BOBBIO, 1999, pág.17).
O Jusnaturalismo Medieval é aquele que se desenvolve no período medieval e é extremamente pautado em fundamentos religiosos e caracteriza-se por pregar um Direito Universal, geral (genérico) que tenha como escopo fundamental a busca por uma justiça dentro dos liames do cristianismo, ou melhor, da Igreja. Dentre as obras de Direito Natural desta época, destacam-se as do filósofo católico Santo Tomás de Aquino que definia a lex naturalis, como: “Partecipatio legis aeternae in retionali creatura” – aquilo a que o homem é levado a fazer pela sua natureza racional (BOBBIO, 1999, pág. 20).
 Conforme explica Hugo Grócio, citado por Norberto Bobbio, Jusnaturalismo Moderno ou Racional é aquele que busca através de uma justa razão atingir os ideais de moral e justiça respeitando a natureza racional do homem (BOBBIO, 1999). Neste mesmo sentido, Luís Roberto Barroso afirma que o Jusnaturalismo Moderno é aquele que se desenvolve através das ideias dos filósofos racionalistas do século XVI e que se pauta em uma “lei ditada pela razão”, dando-se ênfase a natureza e a razão humana, o que “é um dos marcos da Idade Moderna e base de uma nova cultura laica, consolidada a partir do século XVII” (BARROSO, 2009, pág. 236).
Ainda sobre o Jusnaturalismo Racional, Lopes, Queiroz e Acca, em seu Curso de História do Direito, afirmam que “o jusnaturalismo moderno manifesta-se enquanto o sistema de justiça real é ainda operado por gente formada na escola do ius commune” (LOPES; QUEIROZ; ACCA, 2006, pág. 95). Disto decorre que o Jusnaturalismo Moderno pauta-se em um Direito Consuetudinário, embasado sob a ótica da Justiça aos olhos dos filósofos racionalistas enquanto escopo fundamental do Direito, uma justiça comum derivada dos costumes e valores da sociedade.
Miguel Reale – em Filosofia do Direito – trabalha o Jusnaturalismo sob a ótica de duas teorias: a Transcendente e a Transcendental. Segundo Reale, a Teoria Transcendente concebe o Jusnaturalismo “como um arquétipo ideal, uma realidade ontológica válida em si mesmo”, ou seja, um sistema perfeito que independe de qualquer outra coisa para existir, pois é auto-suficiente. Já a Teoria Transcendental restringe a esfera de ação do Jusnaturalismo “ao plano deontológico, em correlação e funcionalidade necessária com o plano da experiência histórica do Direito”, ou seja, restringe o Jusnaturalismo a um plano de valores sociais historicamente estabelecidos e necessariamente tutelados pelo Direito (REALE, 2002, pág. 590).
Norberto Bobbio compila, de modo geral, os principais critérios que caracterizam o Jusnaturalismo, de modo que, pode-se afirmar que os Direitos Naturais são universais, ou seja, válidos para todos e em todos os lugares; imutáveis, ou seja, válidos em qualquer tempo; de cognição racional, ou seja, conhecidos através da razão humana; produzidos pela natureza, ou pela razão humana ou ainda por Deus ou qualquer outra entidade divina; objetivamente bons, ou seja, estabelecem aquilo que é bom para a sociedade, ou melhor, aquilo que é justo; e por fim, não são indiferentes aos comportamentos regulados, ou seja, eles os valoram (BOBBIO, 1999).
Em sua Teoria Geral do Direito, Norberto Bobbio critica veementemente o Jusnaturalismo, pois, para ele, não existe um direito que seja válido em todos os lugares e em todos os tempos, pois as concepções sociais são mutáveis, de modo que, o que é bom e justo hoje não era ontem e não será amanha, bem como, o que é justo para uma sociedade de cultura oriental pode não ser para uma sociedade de cultura ocidental etc. Critica também, afirmando que é impossível existir um ordenamento jurídico completamente justo, ou seja, que não contenha regras injustas e, nesse mesmo sentido, afirma que na ceara jurídica “vale como direito também o direito injusto” (BOBBIO, 2007, pág. 36). 
Na linha evolutiva da História, após a cisão entre Igreja e Estado e a ascensão dos Soberanos, na prática, pouca coisa mudou, os comerciantes continuaram a se submeter de forma extremada aos governantes, as atrocidades contra o ser humano não diminuíram, os nobres e o clero continuaram a ter privilégios, em suma, a realidade social se quedou inerte. Tudo isso despertou movimentos revolucionários, principalmente da classe burguesa, que com o apoio do iluminismo, se organizou em busca de poder político, liberdade (comercial), igualdade (legal) e de muitos outros direitos defendidos pelos jusnaturalistas (LOPES; DOS SANTOS, 2010).
Nesse sentido, conforme afirma Luís Roberto Barroso, “a Revolução Francesa e sua Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) e, anteriormente, a Declaração de Independência dos Estados Unidos (1776) estão impregnadas de idéias jusnaturalistas” (BARROSO, 2009, pág. 237).
Ainda segundo Barroso, os iluministas e os jusnaturalistas estiveram juntos no movimento de codificação do Direito, durante o século XVIII, “cuja maior realização foi o Código Civil Francês – o Código Napoleônico”. Entretanto, conclusa a Revolução Francesa, com a codificação dos direitos em diversos países da Europa, o Jusnaturalismo se viu – conforme explica José Reinaldo de Lima Lopes, citado por Barroso – “domesticado e ensinado dogmaticamente”, ou seja, a codificação, grosso modo, “cortou as pernas” do Jusnaturalismo limitando-o e impedindo-o de se desenvolver livremente como até então se desenvolvia e, por fim, o “substituiu” por uma nova doutrina – o Positivismo Jurídico (BARROSO, 2009, pág. 238). 
Norberto Bobbio, Matteucci e Pasquino, citados por Luís Roberto Barroso, afirmam que
O advento do Estado Liberal, a consolidação dos ideais constitucionais em textos escritos e o êxito do movimento de codificação simbolizaram a vitória do direito natural, o seu apogeu. Paradoxalmente, representaram, também, a sua superação histórica (BARROSO, 2009, pág. 238).
Nessa mesma linha de raciocínio, Tercio Sampaio Ferraz Junior, pautando-se nas ideias de Nicolas Luhmann, afirma que a constitucionalização dos Direito Naturais, ou ainda, dos Direitos Fundamentais, não só “os positivou”, mas provocou gradativamente sua trivialização, o que, conseqüentemente, gerou uma indiferença em relação as suas próprias diferenças (FERRAZ JR., 2003).